Interfaces cérebro-computador abrem fronteiras no marketing

As interfaces cérebro-computador (BCIs, Brain Computer Interface System) não pertencem mais ao domínio exclusivo da ficção científica. Essa tecnologia, que há décadas figura no imaginário popular como símbolo de um futuro cibernético, está gradualmente se tornando realidade. Mas será que estamos prontos para os impactos éticos, sociais e políticos que acompanham essa revolução?

Hoje, já é possível mover um cursor na tela, digitar, desenhar ou até jogar um videogame usando apenas os pensamentos. A pesquisa, iniciada nos anos 1970, avançou a passos largos com o apoio de áreas como inteligência artificial e nanotecnologia. Empresas como Neuralink e iniciativas governamentais dos Estados Unidos, China e União Europeia disputam a liderança na corrida por uma tecnologia que pode, potencialmente, transformar a forma como interagimos com o mundo digital.

BCIs invasivas, que exigem a implantação de eletrodos no cérebro, oferecem maior precisão, mas levantam sérias preocupações médicas e éticas. Já as não invasivas, como as baseadas em eletroencefalografia (EEG), são mais seguras, embora menos eficazes em captar os sinais cerebrais necessários para um controle refinado.

O maior avanço das BCIs até agora se dá na área da saúde. Pacientes com paralisia já conseguem operar próteses robóticas ou se comunicar apenas com o pensamento. Pesquisas indicam potencial para tratar doenças como Parkinson, epilepsia e depressão, além de vislumbrar aplicações na recuperação da visão ou da fala.

No campo econômico e social, BCIs poderiam revolucionar profissões ao permitir controle direto de máquinas, aprimorar produtividade e transformar a educação por meio de aprendizado personalizado e imersivo. Na arte e na música, abre-se a possibilidade de criar por meio do pensamento, expandindo os limites da expressão humana. O entretenimento, especialmente os games e o metaverso, também estão na mira dessa tecnologia.

Os BCIs desafiam a própria noção de autonomia. Se a tecnologia permite alterar estados mentais, modular emoções ou até induzir decisões, onde fica o livre-arbítrio? Democracias podem ser corroídas se os cidadãos perderem a capacidade de formar opiniões e escolhas livres de interferência.

O avanço das BCIs é inevitável. A pergunta não é mais “se” essas tecnologias se tornarão comuns, mas “quando” e “como” serão integradas ao cotidiano. Para evitar que interesses comerciais ou militares ditem as regras, é fundamental que a sociedade se antecipe.

A União Europeia e organismos como a OCDE e a UNESCO já começam a delinear padrões éticos globais. Iniciativas como a proteção de dados cerebrais na Constituição chilena e leis pioneiras nos EUA, como a do Colorado, indicam caminhos possíveis. Mas o desafio é enorme: criar marcos regulatórios que protejam direitos e liberdades sem frear o potencial benéfico das BCIs, especialmente no campo da saúde.

Interfaces cérebro-computador representam um divisor de águas na relação entre humanos e máquinas. As fronteiras do possível se ampliam, mas o preço da negligência pode ser alto. Para que BCIs sejam aliadas do progresso e não instrumentos de dominação, precisamos de um debate amplo, transparente e inclusivo. O futuro da liberdade humana pode, literalmente, estar em nossas mentes — e nas mãos de quem as conecta às máquinas.

BCIs no marketing: a mente como novo campo de oportunidades 

Se as interfaces cérebro-computador (BCIs) prometem revolucionar a saúde, o trabalho e o entretenimento, seu impacto no marketing e nos negócios será igualmente enorme. Ao abrir uma janela direta para os pensamentos, emoções e intenções dos consumidores, essas tecnologias podem criar um paradigma nas relações entre marcas e público.

Hoje, profissionais de marketing recorrem a ferramentas como eye tracking, ressonância magnética funcional e análises comportamentais para tentar decifrar o que motiva a decisão de compra. As BCIs vão além: permitem captar sinais cerebrais associados à preferências, aversões, nível de atenção, engajamento emocional e até intenções de compra — em tempo real.

Imagine testar uma campanha publicitária enquanto o consumidor assiste, e detectar imediatamente o momento exato em que ele perde interesse ou quando um estímulo visual gera prazer. Isso abre caminho para:

Criação de campanhas ultrassegmentadas, adaptadas às reações individuais;
Testes A/B neurológicos, em que o próprio cérebro “escolhe” a versão mais eficaz;
Design de produtos e embalagens com base no que realmente ativa o desejo no consumidor.

Experiências imersivas e personalizadas

No ambiente do varejo físico ou digital, BCIs poderão criar experiências sob medida. Em uma loja de realidade virtual ou no metaverso, os estímulos poderiam se ajustar em tempo real ao estado mental do consumidor: cores, sons, ofertas e mensagens seriam moduladas para otimizar a conversão.

Além disso, dispositivos BCIs acoplados a wearables (como fones ou óculos inteligentes) poderiam oferecer interfaces de compra controladas pelo pensamento. Isso simplifica o processo e pode reduzir a fricção no funil de vendas.

BCIs não apenas permitem captar a atenção — podem modular o estado mental do consumidor, aumentando concentração ou reduzindo distração. Isso levanta sérias questões éticas: até que ponto será legítimo influenciar um cliente no momento da decisão de compra? O risco de manipulação é real, e as marcas terão de caminhar na tênue linha entre personalização e invasão da autonomia.

As empresas que souberem se posicionar no ecossistema das BCIs poderão:

  • Desenvolver novos produtos e serviços integrados à neurotecnologia, como aplicativos de compras por pensamento ou plataformas de entretenimento imersivo;
  • Oferecer novas métricas de sucesso, baseadas não só no comportamento, mas no impacto emocional e cognitivo de suas ações de marketing;
  • Ganhar vantagem competitiva, ao usar BCIs para inovar em customer experience, fidelização e relacionamento com o cliente.

BCIs inauguram um novo capítulo no marketing, onde o conhecimento e o engajamento do consumidor atingirão um nível sem precedentes. Mas, junto com as oportunidades, surgem responsabilidades. Será essencial estabelecer códigos de conduta e regulações que impeçam abusos e preservem o direito do consumidor à privacidade mental e ao livre-arbítrio.

As empresas que quiserem alavancar negócios com BCIs precisarão aliar inovação tecnológica à ética corporativa. Mais do que nunca, o sucesso no marketing dependerá não só de ler a mente do cliente, mas de respeitá-la.